Tenho boas recordações da minha infância. Eu ia à igreja todos os dias da semana, pois meus pais eram muito ativos na igreja, e eu brincava muito com os amigos da igreja, onde várias famílias da igreja eram nossos vizinhos.
Por alguns anos eu morei em uma rua sem saída, e me lembro das mães com as janelas abertas, vigiando seus filhos brincando na rua. Muitas destas janelas eram grandes e largas, e muitas vezes, eu e as outras crianças nos debruçávamos nas janelas, pedindo água ou refresco para amenizar a sede. Dava pra ver a sala ou os quartos, sempre com as janelas abertas de modo a facilitar a passagem do vento, já que não havia ar-condicionado na maioria das casas. E até hoje tenho na memória a estampa do papel de parede ou da tapeçaria de uma residência!
Os anos passaram, e hoje raramente vemos as casas uns dos outros. Mesmo em cidades pequenas do interior, as janelas são fechadas, e os membros das famílias se enclausuram em seus quartos para assistirem vídeos em seus celulares.
Vizinhos de apartamentos mal se conhecem, e as pessoas, especialmente nas grandes cidades, não abrem mais as suas janelas para deixar o sol entrar.
Eu gosto de janelas. Imagino Mical olhando Davi da janela do palácio, e as janelas de Daniel, voltadas para Jerusalém. Penso na janela da arca de Noé, na janela através da qual Raabe desceu os espias, ou na janela em que Êutico se sentou e adormeceu. Sempre haverá janelas abertas para belas paisagens, que mostram o nascer do sol ou o brilho do luar.
Nossos corpos também têm janelas – são os nossos olhos. O livro de Eclesiastes, ao falar sobre a velhice, descreve a perda da visão dizendo: quando aqueles que olham pelas janelas enxergarem embaçado (Eclesiastes 12.3). Os olhos apreendem as paisagens da vida, deixando entrar a brisa suave e o calor do sol – mas também avista a tempestade, e assiste a noite escura e fria. Os olhos fazem a interface com a realidade vívida, e se assombram, se machucam e se emocionam com o comportamento das pessoas que observam.
Por outro lado, quando conseguimos nos debruçar nas janelas dos outros, podemos olhar para dentro da alma alheia. Quando alguém está feliz, a seriedade pode estar estampada no rosto, mas o olhar ganha um brilho especial. Quando uma criança planeja um algo, ela pode estar quieta, mas o seu olhar arteiro entrega os seus planos. Quando a tristeza impera, a boca pode sorrir, mas o olhar permanece triste.
Observe mais os olhares de quem ama.
Enxergue a dor do seu filho, a tristeza da sua filha, ou a estafa física e emocional do seu cônjuge, antecipando-se para ajudá-los amorosamente.
Observe mais seu olhar.
Preste mais atenção para aonde você olha, e analise para os motivos das suas escolhas.
Por que olha tanto para o passado?
Por que não olha menos para os erros dos outros?
Por que olha tanto para o que faz você infeliz, reacendendo lembranças dolorosas?
Olhe mais para você e menos para os outros. Compare-se menos, aceite-se mais.
Olhe mais para cima, de onde vem o seu socorro (Salmo 121.1), e bem menos para a pequenez dos seus problemas ou dificuldades.
Abra a janela e deixe o sol da justiça entrar na sua alma!
Por Elaine Cruz (psicóloga clínica e escolar, com especialização em Terapia Familiar, Dificuldades de Aprendizagem e Psicomotricidade).