“Não mintais uns aos outros, pois que já vos despistes do velho homem com os seus feitos.” (Cl 3.9)
INTRODUÇÃO
Na próxima lição nos trará uma reflexão muito pertinente. Mesmo depois de receber o derramamento do Espírito Santo, a igreja primitiva foi atacada por Satanás por meio de um instrumento que é capaz de levar destruição para as relações humanas: a mentira. Em Atos capitulo 5 apresenta o casal Ananias e Safira que, no lugar de entregar uma oferta voluntária e desprendida, dissimulou e manipulou uma oferta diante de uma causa tão nobre. A história bíblica de Ananias e Safira é um alerta quanto ao malefício da mentira em nossa família e igreja.
I – UMA CONVERSÃO DUVIDOSA
1- Por que uma conversão duvidosa?
Ainda que o texto não diga nada da conversão ou não do casal, percebe-se na narrativa do texto (At 5.1,2) que um homem chamado José, conhecido como Barnabé, tinha dado uma grande oferta de amor. Essa atitude de Barnabé chamou a atenção de Ananias e Safira, que se encheram de ciúme e inveja porque desejavam receber a admiração dos apóstolos tanto quanto Barnabé.
Esse comportamento de Ananias e Safira transpareceu simpatia com o novo grupo religioso, o casal parecia estar convencido de que Cristo era o Salvador de todos os homens. Entretanto, suas atitudes não os identificavam como pessoas transformadas pelo poder do evangelho. Haviam sido atraídos pela igreja, mas as suas obras não correspondiam com a obra do Espírito Santo em suas vidas.
O casal pareceu apenas simpático ao evangelho, os dois não permitiram em suas vidas uma transformação como acontece quando o Espírito Santo regenera o pecador. Doutro modo, Ananias e Safira poderiam ter experimentado o poder regenerador do Espírito Santo, mas deram lugar ao Diabo para contaminar a pureza da comunhão, se deixando levar por um espírito de mentira e fingimento perante os apóstolos e a igreja.
Possivelmente, o casal fez parte daquela multidão que ouviu a mensagem de Pedro e recebeu de bom grado a Palavra pregada, mas ainda não tinham confessado seus pecados. Como Ananias e Safira, existem muitas pessoas que gostam da igreja e até participam dos cultos, mas não se convertem, não fazem confissão de fé. Inicialmente, no grande movimento do Espírito no Dia de Pentecostes, Ananias e Safira se uniram aos discípulos e passaram a fazer parte da comunidade dos crentes em Cristo.
Entretanto, os dois, marido e mulher, mantiveram alguns hábitos da velha vida e, por isso, não tiveram dificuldades em fingir uma espiritualidade que não tinham. Os sinais da velha natureza pecaminosa foram demonstrados em hipocrisia, cobiça e mentira. (Cabral. Elienai, RELACIONAMENTOS EM FAMÍLIA Superando Desafios e Problemas com Exemplos da Palavra de Deus. Editora CPAD. 1ª edição: 2023. pag. 186-187).
2- A comunhão na igreja de Atos.
Atos 4.32,34,35 relata esse fato, como segue:
“D a multidão dos que creram era um o coração e a alma. Ninguém considerava exclusivamente sua nem uma das coisas que possuía; tudo, porém, lhes era comum. Pois nenhum necessitado havia entre eles, porquanto os que possuíam terras ou casas, vendendo-as, traziam os valores correspondentes e depositavam aos pés dos apóstolos; então, se distribuía a qualquer um à medida que alguém tinha necessidade”.
Crentes cheios do Espírito têm o coração aberto e o bolso também. O amor não consiste naquilo que falamos, mas no que fazemos. A comunhão passa pelo compartilhar. A unidade da igreja transformou-se em solidariedade. Pessoas eram mais importantes do que coisas, pois os crentes adoravam a Deus, amavam as pessoas e usavam as coisas.
John Stott destaca que a venda de propriedades era voluntária e esporádica, à medida que surgia a necessidade de dinheiro. Adolf Pohl diz que aqui não se ensaiava um novo modelo social nem se definia um novo “conceito de propriedade”.
William Barclay é claro nesse ponto: “A sociedade chega a ser verdadeiramente cristã não quando a lei nos obriga a repartir, mas quando o coração nos move a fazê-lo”. O reformador João Calvino, já no século XVI, ao analisar o texto em questão, escreve de forma vívida: Seria preciso que tivéssemos corações mais duros do que o aço para não sermos tocados pela leitura desta narrativa. Naqueles dias os crentes davam abundantemente daquilo que era deles; hoje, não nos contentamos em guardar egoisticamente aquilo que é nosso, mas, insensíveis, queremos roubar os outros.
Eles vendiam os seus próprios bens naqueles dias; hoje, é o desejo de possuir que reina supremo. Naquele tempo, o amor fez com que a propriedade de cada homem se tornasse a propriedade comum para todos os necessitados; hoje, a desumanidade de muitos é tão grande que de má vontade concedem que o pobre more nesta terra e desfrute a água, o ar e o céu juntamente com eles. (LOPES. Hernandes Dias. Atos. A ação do Espírito Santo na vida da igreja. Editora Hagnos. pag. 112-113).
3- A inveja e a hipocrisia de Ananias e Safira.
“Entretanto, certo homem, chamado Ananias, com sua mulher Safira, vendeu uma propriedade, mas, em acordo com sua mulher, reteve parte do preço e, levando o restante, depositou-o aos pés dos apóstolos”. (At 5.1,2)
Ananias e Safira não eram pessoas desclassificadas. Eram membros da igreja. Foram batizados. Viviam junto com os outros irmãos, cantavam e oravam. Falavam a mesma linguagem da fé. Externamente eram crentes maravilhosos.
O exemplo de desprendimento de Barnabé os fascinou. Tiveram o ímpeto de imitá-lo, mas tentaram jeitosamente o meio-termo. A dádiva deles não era produzida pelo amor. O amor deles era falso. Estavam cheios de egoísmo. Buscavam louvores dos homens e reconhecimento por parte das pessoas. Ananias e Safira estavam mancomunados na mentira. Queriam glórias pessoais. Eram hipócritas e falsos filantropos.
A hipocrisia é a dissimulação deliberada, a tentativa de fazer com que as pessoas acreditem que somos mais espirituais do que na realidade somos. O nome Ananias significa “Deus é cheio de graça”, mas Ananias descobriu que Deus também é santo. Safira quer dizer “bela”, mas o pecado tornou seu coração repulsivo. (LOPES. Hernandes Dias. Atos. A ação do Espírito Santo na vida da igreja. Editora Hagnos. pag. 115-116).
4- Quando a mentira e o engano enchem os corações.
Então, disse Pedro: Ananias, por que encheu Satanás teu coração, para que mentisses ao Espírito Santo, reservando parte do valor do campo? Conservando-o, porventura, não seria teu? E, vendido, não estaria em teu poder? Como, pois, assentaste no coração este desígnio? Não mentiste aos homens, mas a Deus. Satanás havia derramado suas sugestões malignas no coração de Ananias e Safira.
O casal, em vez de resistir ao diabo, deu guarida às suas propostas. Caíram na sua armadilha e resolveram hipocritamente mentir ao Espírito Santo e enganar a igreja. Adolf Pohl dá o seu brado de alerta: “Que fato horrível: um coração anteriormente repleto do Espírito Santo de Deus agora está cheio de Satanás! Isso é possível. Não temos direito a qualquer atitude autoconfiante”.
Ananias cometeu um pecado ainda mais grave do que mentir ao Espírito Santo (5.3). Literalmente este texto diz: “Ananias, como é que Satanás encheu o teu coração para falsificar o Espírito Santo?”.
O pecado dele não foi apenas mentir ao Espírito Santo, mas tentar falsificar o Espírito Santo, buscando representar sua fraudulenta ação como divinamente inspirada. Assim, ele procurou fazer com que o Espírito Santo participasse do seu horrendo crime. Ananias não teria cometido nenhum pecado se não vendesse sua propriedade; ou se vendesse e não desse nada ou só a metade.
Seu pecado foi dar parte, dizendo que estava dando tudo. Seu pecado foi mentir ao Espírito e enganar a igreja. Por trás da hipocrisia de Ananias estava a atividade sutil de Satanás. O perverso inimigo que já havia atacado a igreja através da perseguição, agora a ataca sedutoramente por meio da corrupção.
Quando Pedro declarou que Ananias reteve parte do dinheiro, emprega o verbo nosphizomai, que significa “apropriar-se indevidamente”. A mesma palavra foi usada na Septuaginta em relação ao roubo de Acã e, na única outra ocorrência no Novo Testamento (Tt 2.10), esse verbo significa “roubar”. Devemos pressupor, portanto, que, antes da venda, Ananias e Safira assumiram algum tipo de compromisso no sentido de darem à igreja todo o dinheiro.
Por causa disso, quando entregaram apenas parte do valor, em vez de tudo, tornaram-se culpados de apropriação indébita. John Stott diz que o problema de Ananias e Safira foi falta de integridade.
Eles não eram apenas avarentos, mas também ladrões e mentirosos. Queriam o crédito e o prestígio da generosidade sacrificial, sem terem de arcar com as inconveniências. Assim, a motivação do casal, ao dar, não era aliviar os pobres, mas inflar o próprio ego. (LOPES. Hernandes Dias. Atos. A ação do Espírito Santo na vida da igreja. Editora Hagnos. pag. 116-117).
II – O PROBLEMA DA MENTIRA DENTRO DA FAMÍLIA
1- A mentira produzida dentro da família.
Mentira é o falseamento a verdade. Quando um cristão mente, ele está cooperando e aliando-se com Satanás, que é o pai da mentira. Espalhar contenda entre os irmãos é o pecado que a alma de Deus mais abomina (Pv 6.16-19). Russell Shedd alerta: As críticas aos nossos irmãos devem ser de tal modo dominadas pelo amor que sempre expressem o desejo de encorajar, e nunca a intenção de destruir maliciosamente. Cuidado com as fofocas e os comentários desnecessários que, ao invés de encorajar e abençoar, amaldiçoam e desestimulam.
2- Quem faz uso da mentira está dominado pelo poder da carne.
O apóstolo Paulo escreveu aos Gálatas no capítulo 5.17,24,25:
“Porque a carne cobiça contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne; e estes opõem- se um ao outro; para que não façais o que quereis. E os que são de Cristo crucificaram a carne com as suas paixões e concupiscências. Se vivemos no Espírito, andemos também no Espírito”.
A palavra “concupiscência” no grego bíblico é epithymia, que significa “anseio” (especialmente por aquilo que é proibido). A mentira é aliada da concupiscência porque esta se alimenta de coisas como a mentira para satisfazer a carne. Convivemos com as pequenas e ingênuas mentirinhas; porém, nem grandes nem pequenas mentiras, porque toda mentira tem sua fonte no Diabo, que é o pai da mentira (Jo 8.44,45). (Cabral. Elienai, RELACIONAMENTOS EM FAMÍLIA Superando Desafios e Problemas com Exemplos da Palavra de Deus. Editora CPAD. 1ª edição: 2023. pag. 197).
III – PROTEGENDO A FAMÍLIA DA MENTIRA E DA HIPOCRISIA
1- Cuidado contra os defeitos morais no lar.
Acã tinha ficado com certos objetos, como despojos, embora estes pertencessem exclusivamente a Yahweh. Ele pôs em prática algo extremamente tolo, e isso foi fatal, porquanto ele e seus familiares foram executados.
Observe o leitor o que se lê no primeiro versículo deste capítulo: “Prevaricaram os filhos de Israel”. A solidariedade comunitária significava que um pecado cometido por algum de seus membros era imputado a todos os membros. Foi exatamente por esse motivo que o exército de Israel sofreu derrota em Ai.
Era mister remover o pecado, antes que a conquista da Terra Prometida pudesse prosseguir. O autor sagrado ocupa dois capítulos do livro para contar-nos o incidente, o que mostra quão importante foi essa questão aos olhos dele. (CHAMPLIN, Russell Norman, Antigo Testamento Interpretado versículo por versículo. Editora Hagnos. pag. 923).
2- Precisamos agir contra a hipocrisia e a mentira.
Em conluio com sua mulher, Ananias reteve para si uma parte do dinheiro da venda de uma propriedade e, com total fingimento, entregou o restante dinheiro aos apóstolos como se fosse o total. O Espírito Santo revelou a Pedro a mentira de Ananias e o confrontou com a verdade. O juízo punitivo de Deus foi imediato.
Fulminantemente, Ananias caiu diante de todos e morreu, causando grande comoção e constrangimento. Não demorou muito tempo, três horas depois, apareceu sua mulher, Safira, com a mesma atitude. Eles consideraram que podiam enganar os apóstolos e a igreja e, ainda, que podiam fazer o que quisessem com o dinheiro.
O juízo do Espírito Santo veio imediatamente, e Pedro, com autoridade, declarou a Safira: “Eis aí à porta os pés dos que sepultaram o teu marido, e também te levarão a ti” (At 5.9). O problema não foi ficar com um pouco daquele dinheiro, como já dito, e sim fingir que estavam dando o dinheiro todo. Sua fraude foi descoberta imediatamente, porque o Espírito Santo revelou a Pedro a falsidade do casal. Eles não estavam mentindo apenas à igreja e ao apóstolo, mas tinham mentido contra o Espírito Santo. (Cabral. Elienai, RELACIONAMENTOS EM FAMÍLIA Superando Desafios e Problemas com Exemplos da Palavra de Deus. Editora CPAD. 1ª edição: 2023. pag. 193-194).
3- Não deixe o Inimigo agir na família.
O apóstolo Pedro deixou claro que Satanás havia entrado no coração do casal para que mentissem ao Espírito Santo. Satanás é o opositor da igreja. Ele comanda seus demônios para que atuem no mundo, especialmente no meio da igreja, para enfraquecer sua força e seu poder contra as hostes da maldade. Nos idos de 1954, na cidade de Itajaí, Santa Catarina, aconteceu algo extraordinário num culto de Santa Ceia.
A igreja era viva e nada ficava escondido na presença do Senhor. O pastor Francisco Germano Miranda (de saudosa memória) dirigia o culto e, ao ministrar o cerimonial da Ceia do Senhor, ao tomar o pão nas mãos, notou que o pão estava duro como pedra. Ele sabia que o pão sempre vinha fresquinho e maleável, mas naquela noite o pão estava duro como pedra.
O Espírito Santo lhe falou que havia pecado não confessado e que a pessoa em pecado ia tomar o pão e o vinho, símbolos do corpo de Cristo. Falou à igreja e disse que se sentia impedido de continuar a Ceia enquanto não houvesse confissão de pecado. Todos oraram com fervor, até que uma irmã veio à frente e confessou o seu pecado. O pastor Miranda orou por essa mulher e houve comoção entre todos. Ao voltar para a mesa da Ceia, o pastor Miranda tomou o pão e percebeu que estava macio como tinha vindo para a mesa da Ceia. O Espírito de Santidade é que opera a santificação, e quando um crente não se submete a Ele, o Espírito acusa o pecado e opera o quebrantamento.
É fato indiscutível que Satanás está ativo na Terra e age especialmente contra a Igreja de Cristo, que é a força maior contra o seu domínio. Ele trabalha não só contra a Igreja coletivamente, mas Satanás age investindo em pessoas.
Quando Pedro pergunta a Ananias “Por que encheu Satanás o teu coração” (ARC) ou, como está na NVI, “Ananias, como você permitiu que Satanás enchesse o seu coração” (At 5.3), mostra que o pecado de Ananias e Safira foi um pecado estimulado por Satanás, indicando que, se ele não puder atingir a igreja, por meio de ataques externos, se infiltrará na casa de Deus nos corações que permitam a sua entrada. E quando Satanás consegue entrar no coração de um crente, sem dúvida, usará de sua força para induzir o crente a pecar contra o Espírito Santo. (Cabral. Elienai, RELACIONAMENTOS EM FAMÍLIA Superando Desafios e Problemas com Exemplos da Palavra de Deus. Editora CPAD. 1ª edição: 2023. pag. 194-195).
CONCLUSÃO
Precisamos estabelecer uma cultura da verdade dentro de uma família cristã. Onde prevalece a verdade, há confiança e segurança. Deus se agrada disso. Essa cultura da verdade na família deve começar pelos pais seja membro ou obreiro. Ela passa também pelo confronto das famosas “mentirinhas” das crianças. Não por acaso, em nosso país, há o conhecido dia da mentira, 1° de Abril, onde culturalmente se é permitido “mentir”. Precisamos confrontar esse tipo de cultura em nossa família e em nossas demais relações com a verdade da Palavra de Deus. A Igreja é a coluna e a firmeza da verdade (1Tm 3.15). Caminhemos na verdade, mesmo em momentos que pareçam difíceis, pois sempre o caminho de verdade é melhor.